Nos últimos anos, o consumidor brasileiro vem se preocupando cada vez mais com os seus hábitos alimentares, olhando um pouco mais para os ingredientes dos alimentos e para sua densidade nutricional, ou seja, o quão rico em termos nutricionais aquele produto se notabiliza.
Com isso, observa-se a reinvenção de diversos mercados alimentícios em busca de mais inovações, e atendendo as principais demandas exigidas de qualidade, saudabilidade e diversidade pelos criteriosos e informados clientes da nova geração. Dentre esses produtos, destaca-se o sorvete, que apesar de ser nutritivo por conter diversos componentes oriundos do leite, tem buscado se adequar às principais necessidades atuais.
O sorvete é um produto tradicional da indústria de alimentos e pode ser definido como uma mistura congelada de uma combinação de componentes do leite, açúcares (ou edulcorantes), estabilizantes, emulsificantes e agentes saborizantes.
Essa mistura, chamada de calda, é tratada termicamente, homogeneizada e maturada antes de ser congelada. O tratamento térmico visa reduzir ou eliminar os microrganismos presentes na calda, já a homogeneização é realizada para reduzir o tamanho dos glóbulos de gordura e tornar a emulsão mais fina e estável.
A maturação melhora as características físico-químicas e sensoriais do sorvete, conferindo corpo, textura mais macia, e melhor taxa de overrun (incorporação de ar). Durante a batedura e congelamento os cristais de água são reduzidos visando atingir uma textura suficientemente cremosa e leve ao produto acabado, além de duplicar o volume inicial da mistura, convertendo-se em sorvete.
Segundo dados da Associação Brasileira das Indústrias e do Setor de Sorvetes (ABIS, 2020), o Brasil apresenta mais de 10 mil empresas relacionadas à cadeia de produção de sorvetes e gelatos, com um faturamento acima de R$13 bilhões por ano, sendo um dos 10 principais produtores do mundo.
Contudo, nos últimos anos ocorreram oscilações nos números de consumo no país, e apesar de ser um país tropical, a média de consumo per capita no Brasil foi de 5,29 litros/ano, média baixa comparada ao consumo mundial, e em especial com a Nova Zelândia e os EUA, que têm se destacado como os maiores consumidores de sorvetes do mundo, com um consumo per capita de 28,3 litros/ano e 20,8 litros/ano, respectivamente.
Especialistas como a empresária Sandra Chaves, mestre sorveteira e proprietária da Artesane Gelateria, localizada em São José dos Campos, no interior de São Paulo, apontam que as principais tendências para sorveterias e indústrias de sorvetes em 2021 serão focadas no desenvolvimento de produtos naturais e mais saudáveis.
Acredita-se que haverá um forte crescimento na oferta de sorvetes para pessoas que possuem restrições alimentares, seja por escolha ou não, como produtos zero açúcar para os diabéticos, sem glúten para os celíacos e veganos para aqueles que seguem esse tipo de alimentação, além de novidades como os lançamentos de opções de produtos com menos calorias do que as versões tradicionais.
Exemplos como a empresa LOWKO®, startup criada pelo brasileiro Rodrigo Studart, possui como foco principal o desenvolvimento de sorvetes mais saudáveis por meio da utilização de ingredientes naturais e adoçantes oriundos de frutas e legumes para se manter zero açúcar, permitindo que os apaixonados pelo produto consumam sem culpa.
Ainda, para alcançar a cremosidade típica de sorvetes tradicionais, os produtos usam fibras também retiradas das frutas. Atualmente a marca possui 12 sabores diferentes e já se encontra presente em diversos varejistas do país como Carrefour e Pão de Acúçar, apresentando uma estimativa de faturamento de R$ 10 milhões para 2021, o dobro do alcançado no ano anterior.
Já a Yamo®, primeira startup de sorvetes do Brasil, produz sorvetes que não utilizam ingredientes artificiais, saborizantes e corantes, além de serem plant-based, ou seja, produzidos a base de plantas e frutas, sem adição de glúten, lactose ou gorduras saturadas.
A base do seu produto é o inhame, conhecido como um superalimento por suas propriedades nutricionais, e a gordura, substituída pelo tahine à base de gergelim, que também fornece uma dose de proteínas.
Ao compreender os desafios do futuro da alimentação, em um mundo que pode chegar a 10 bilhões de habitantes em meados de 2050, pesquisas sobre alimentos que consumimos com frequência e que ainda não tenham substitutos realmente saudáveis e sustentáveis estarão cada vez mais em voga, e neste sentido o sorvete se mostra uma opção bem oportuna.
A elaboração de sorvete de cupuaçu utilizando fibra de casca de maracujá como substituto de gordura por pesquisadores da Universidade Federal de Mato Grosso do Sul (UFMS), por exemplo, demonstrou um sabor exótico e pouco explorado. Além de uma alternativa que agrega valor nutricional, reduz o aporte energético do produto e adicionalmente exercer efeitos benéficos na prevenção e no tratamento de dislipidemias e doenças crônicas não transmissíveis, mantendo os principais aspectos nutricionais e de aceitabilidade.
Neste sentido, percebe-se que, de maneira geral, a receptividade e aceitação de sorvetes reformulados e inovadores pelos consumidores têm apresentado resultados bastante animadores, e têm inspirado e impulsionado o crescimento do setor com consumidores que buscam desde melhorias em seu padrão alimentar até a aquisição de benefícios adicionais à saúde através do produto.
Autores
Rafael Marrafa Leal, Departamento de Tecnologia de Alimentos, Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro (UFRRJ);
Rebeca de Lima Costa, Departamento de Tecnologia de Alimentos, Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro (UFRRJ);
Wanessa Pires da Silva, Departamento de Tecnologia de Alimentos, Universidade Federal Fluminense (UFF);
Carolina de Souto Portel, Departamento de Alimentos, Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Rio de Janeiro (IFRJ);
Mônica Marques Pagani, Departamento de Tecnologia de Alimentos, Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro (UFRRJ);
Adriano Gomes Cruz, Departamento de Alimentos, Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Rio de Janeiro (IFRJ)
Erick Almeida Esmerino, Departamento de Tecnologia de Alimentos, Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro (UFRRJ), Departamento de Tecnologia de Alimentos, Universidade Federal Fluminense (UFF) e Departamento de Alimentos, Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Rio de Janeiro (IFRJ)
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