Já reconhecido como iguaria pelo consumidor que frequenta os empórios de Minas, Rio e São Paulo, o queijo artesanal produzido em Alagoa (MG) chegou à era do marketplace.
Graças ao apoio da pesquisa científica, o queijo e a região produtora foram caracterizados e, recentemente, receberam apoio técnico para serem vendidos pela internet. Muitos queijeiros do município já vendem o produto dessa maneira, mas agora, como resultado do projeto “Queijo Artesanal de Alagoa, da tradição ao futuro – uma evolução mercadológica,” da Embrapa Gado de Leite , os queijeiros estão prestes a lançar a sua plataforma de comércio eletrônico .
O presidente da Associação dos Produtores de Queijo Artesanal de Alagoa ( AproAlagoa ), Francisco Antônio Barros Jr., diz que restam apenas algumas questões burocráticas a serem resolvidas para a plataforma começar a funcionar. Até lá, é possível conhecer os produtos no site da AproAlagoa , que também passaram por uma remodelação, outro resultado do projeto que a Embrapa coordenou.
Para o extensionista da Empresa de Assistência Técnica e Extensão Rural de Minas Gerais ( Emater-MG), Júlio Cesar Fleming Seabra, a expectativa é que a produção local venha a dobrar com a nova ferramenta de comércio. Dobrar a produção é algo que os produtores alagoenses já estão acostumados. Segundo Seabra, nos últimos cinco anos houve um aumento de 100% na fabricação de queijos da cidade. Isso se deve, em parte, à grande popularidade que o produto alcançou após conquistar prêmios nacionais e internacionais e se tornar pauta frequente de grandes veículos de comunicação.
Um dos desafios para atender ao aumento da procura é a topografia. As propriedades se localizam nas montanhas da Serra da Mantiqueira, com destaque desfavorável à mecanização. A solução tecnológica proposta pela Embrapa para enfrentar esse problema foi melhorar a qualidade da alimentação do rebanho.
Para isso, foi orientado na região a cultivar de capim-elefante BRS Capiaçu, já adotada em praticamente todas as fazendas do município. Com alta produtividade e qualidade nutricional, a forrageira apresenta alto valor nutritivo, felizmente para a manutenção da saúde e aumento da produtividade das férias.
O primeiro estudo realizado pela Embrapa Gado de Leite, voltado para a produção de queijo nas terras altas da Serra da Mantiqueira, foi a caracterização do ambiente (clima, relevo, água, solo etc.). Também foram identificados aspectos sociais e biológicos, levantando o perfil dos produtores, além da composição microbiológica associada à produção (água, leite, fermento, salmoura e queijo em diferenças de ganho).
Segundo a pesquisadora da Embrapa Nivea Maria Vicentini , esses estudos permitiram o reconhecimento e o estabelecimento dos regulamentos técnicos de identidade e qualidade do queijo artesanal de Alagoa e da Mantiqueira de Minas. Como resultado, houve um aumento substancial da procura pelo queijo da região, exigindo novas ações da Embrapa.
O analista Fábio Homero Diniz diz que as ações relacionadas ao comércio eletrônico atenderam à demanda dos produtores associados da AproAlagoa. A Embrapa Gado de Leite elaborou um projeto propondo alternativas de distribuição do queijo utilizando plataformas digitais. Para tal, foi desenvolvido um site institucional e uma interface gráfica da plataforma e-commerce para serem administrados pela AproAlagoa e disponibilizados aos produtores e consumidores.
Entre as atividades do projeto estava também a reformulação do layout do site da AproAlagoa e a elaboração de um plano de marketing digital para a venda do queijo, que acompanha a aplicação de aulas junto aos produtores para se conhecer os “compradores” do produto (varejistas, intermediários e consumidores finais), o volume de venda para cada segmento, o tempo de relação comercial com o canal de recebimento, as formas de pagamento acordadas etc. “O objetivo final foi encurtar a cadeia de venda e possibilitar o aumento da renda dos produtores” , conclui Diniz.
O município mineiro de cerca de 3 mil habitantes, localizado nas terras altas da Serra da Mantiqueira, produz, em média, três toneladas de queijo por dia. A produção é toda familiar, oriunda de 138 queijeiros, trabalhando em pequenas fazendas de 20 hectares, em média. O negócio passa dos pais para os filhos e há um grande número de jovens queijeiros entrando na atividade.
Um deles é Leonardo Mendes. Formado em Engenharia de Produção, ele chegou a trabalhar em centros urbanos, mas preferiu retornar a Alagoa e continuar o negócio que se iniciou com o bisavô. Segundo Mendes, o preço do queijo melhorou muito e a expansão que a plataforma de e-commerce irá promover tem entusiasmado os produtores.
Francisco Humberto Souza Barros também faz parte da nova geração de queijos. Ele abandonou as aulas de Matemática que lecionava (disciplina na qual é formado), para assumir a queijaria do pai. Sua aposta no crescimento da procura é grande. Para atender à expansão do consumo, ele está construindo um estábulo free-stall que deve ficar pronto neste ano.
Lourenço Martins de Barros, pai de Francisco, acompanhou a valorização do produto local nos últimos anos. Para ele, o segredo do sucesso é investir em tecnologia e citar as ações da Embrapa como uma das responsáveis pelo sucesso do queijo de Alagoa. “Desde que o pesquisador da Embrapa passou a acompanhar e sugerir melhorias na produção, o negócio foi bastante eficiente”, afirma.
100 anos de história e inspirado no queijo de Parma
O queijo alagoense tem mais de um século de tradição. A fabricação de queijos surgiu na cidade por volta dos anos 20 do século passado, quando um italiano de nome Paschoal Poppa apareceu por lá e abriu o primeiro laticínio. Poppa viu no queijo curado, característico da região de Parma, na Itália, o produto ideal para aquela região no alto das montanhas, cujo clima lembrava o do seu país. Por ser um tipo de queijo menos perecível, o produto se adequava aos períodos de chuva, quando a cidade ficava em casa. O queijo era transportado no lombo de burros, em formas de bambu, e no período chuvoso era praticamente impossível descer pelas estradas precárias da região, levando a produção aos mercados urbanos.
Apesar das adversidades, o negócio foi prosperando. Poppa trouxe um queijeiro de fora do município para trabalhar no laticínio. Esse queijeiro acabou se casando com a filha de um “coronel” da região, de nome Porfírio Mendes Filho, que, por influência do gênero, investiu na abertura de cinco laticínios. Os agricultores da região migraram para a pecuária de leite, atendendo à demanda das queijarias.
Passado algum tempo, os grandes laticínios fecharam, mas os pecuaristas já haviam assimilado a cultura das queijarias, passando a produzir, eles mesmos, o próprio queijo. É nessa época que o fermento, o que dá o sabor diferenciado do queijo da região, segundo os alagoenses, foi compartilhado entre os produtores, tornando Alagoa conhecida como “a terra do queijo parmesão”.
Tal denominação, no entanto, é incorreta. Parmesão é um tipo de queijo italiano, com Denominação de Origem Protegida (DOP). Para ser considerado “parmesão”, o queijo tem que ser produzido nas regiões de Parma, Régio da Emília, Módena, Bolonha ou Mântua, tradicionais polos queijeiros italianos. Iniciando o seu segundo século na era do mercado, o produto alagoense tem conquistado prêmios e o nome pelo qual será conhecido nos próximos séculos: “o queijo de Alagoa”.
Apoio à pesquisa e à extensão rural
A Embrapa Gado de Leite e a Emater-MG atuam em conjunto há cerca de uma década para que o queijo de Alagoa siga para além das montanhas da Serra da Mantiqueira. Segundo a pesquisadora Maria de Fátima Ávila Pires , o primeiro passo foi caracterizar o sistema de produção dos queijos. Os pesquisadores da Embrapa selecionaram produtores, identificando-os do ponto de vista econômico e social. “Traçamos o perfil do produtor alagoense e resgatamos os aspectos históricos e culturais da produção do queijo no município”, conta a pesquisadora.
Também foram feitas diversas análises, que envolveram o solo e a água da região (aspectos físicos, químicos e microbiológicos), a alimentação das vacas e as características do leite e do queijo. Essas informações são exigências do Instituto Mineiro de Agropecuária (IMA) para a regulamentação do queijo artesanal.
O trabalho da Embrapa e da Emater-MG também foi útil para que a prefeitura de Alagoa concedesse aos produtores o Selo de Inspeção Municipal (SIM). Atualmente, a Emater-MG e a Embrapa atuam para que o queijo alagoense obtenha a indicação de procedência, como ocorre com os queijos do Serro e Canastra. Isso dará uma identidade geográfica ao queijo, como ocorre com importantes produtos reconhecidos mundialmente, como o Champanhe, da região Champanhe na França; o vinho Bordeaux, na região francesa de mesmo nome e o presunto Parma, da mesma região italiana de onde vem o queijo parmesão.
As informações são da Embrapa, adaptadas pela equipe MilkPoint.
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