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Burrata: origem, características e tecnologia de fabricação

Famosa entre chefes de cozinha, mas pouco conhecida no mercado brasileiro, a Burrata é um queijo de massa filada típico da Apúlia, região que corresponde ao calcanhar da Itália. Ela é tradicionalmente produzida a partir de uma mistura de Mozzarella de leite de vaca e creme.
O nome Burrata se originou do termo italiano “burro”, que significa manteiga, referindo-se ao sabor amanteigado do seu recheio (PINARELLI, 2009). Sem casca, a Burrata é um queijo de massa filada fresco, firme e liso por fora, de cor porcelana brilhante. Sua forma é arredondada, com fechamento apical característico, e peso entre 100 g e 1 kg. Ela se diferencia dos demais queijos de massa filada por apresentar uma parte interior cremosa, de textura única, que é o resultado da mistura de creme de leite fresco ou fermentando e tiras desfiadas de queijo Mozzarella.
A elaboração da Burrata é delicada e envolve várias etapas manuais, bem planejadas e precisas. Assim, durante o processo de filagem da massa de Mozzarella, faz-se uma bolsa ou um "sachetto", no qual é inserida a mistura de creme de leite e tiras finas e desfiadas de queijo Mozzarella recém-fabricado, chamadas pelos italianos de “stracciata”. Em seguida, essa bolsa é fechada, deixando-se uma ponta menor, na forma de um pescoço, lembrando a forma tradicional de queijo Caciocavallo. Depois de prontos, os "sachettos" são comercializados em conserva, utilizando a própria água de filagem ou solução salina, e também em recipientes plásticos sem líquido. Como se trata de um queijo fresco, a Burrata pode ser consumida logo após sua fabricação. Porém, é essencial submetê-la a temperaturas de refrigeração (em torno de 4 °C) para que seu recheio possa adquirir a textura cremosa característica. Recomenda-se, portanto, aguardar pelo menos um dia entre produção e consumo de forma que haja tempo suficiente para que a gordura do creme se cristalize e incorpore os fios de Mozzarella.
A Burrata é consumida principalmente de forma culinária, compondo pratos com alimentos salgados ou doces. Nesse sentido, a qualidade da Burrata está atrelada ao estado físico do creme em seu interior, que deve ser pastoso, sendo indesejável uma textura muito fluida ou muito firme. Deste modo, é importante deixar a Burrata por volta de 30 minutos à temperatura ambiente antes do consumo para permitir um derretimento parcial e desejável do recheio. Os acompanhamentos para a Burrata são variados, sendo comum seu consumo na forma de salada com rúcula, tomate, azeite de oliva, manjericão e pimenta do reino, e também como sobremesa, acompanhada de alimentos doces, como frutas em conserva, geleias variadas e mel.
No Brasil, algumas indústrias de laticínios já fabricam esse tipo de queijo a partir de leite de búfala, comercializando-os imersos em solução salina. Entretanto, como o processo de fabricação não demanda equipamentos específicos e pode ser empregado tanto para leite de búfala quanto de vaca, há uma boa oportunidade para que queijarias e agroindústrias familiares explorem essa variedade de queijo de massa filada no país. Além disso, a produção da Burrata é condizente com os requisitos necessários à obtenção do Selo Arte por produtores artesanais, visto que as etapas de fabricação são majoritariamente manuais.
O Selo Arte foi instituído pela Lei n° 13.680 de 14 de junho de 2018, e permite que produtos de origem animal produzidos de forma artesanal possam ser comercializados em todo o país.
Atualmente, a denominação “Burrata di Andria” é reconhecida pela União Europeia como Identificação Geográfica Protegida (IGP), e é reservada aos queijos fabricados com leite de vaca, provenientes da região da Apúlia, na Itália (COMISSÃO EUROPEIA, 2016b). No Brasil, a Instrução Normativa n° 22, de 24 de novembro de 2005, do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento – MAPA (BRASIL, 2005) permite que essa variedade de queijo seja produzida e comercializada com a denominação “tipo”. Segundo a IN 22/2005-MAPA, a expressão “tipo” deve ser usada em produtos “com tecnologias características de diferentes lugares geográficos, para obter produtos de origem animal com propriedades sensoriais semelhantes ou parecidas com aquelas que são típicas de certas zonas reconhecidas”. Portanto, considerando o fato de que a Burrata é um queijo de massa filada, sua denominação mais apropriada no Brasil seria “queijo Mozzarella tipo Burrata”. Dessa forma, deve-se seguir os requisitos físico-químicos e microbiológicos para queijo Mozzarella preconizados pela Portaria 364/1997 - MAPA, permitindo-se um máximo de 60 % (m/m) de umidade e um mínimo de 35 % (m/m) de gordura no extrato seco (BRASIL, 1997).
O processamento geral de fabricação da Burrata é proposto abaixo. A maior parte do processo é similar à fabricação da Mozzarella, e as etapas foram construídas com base na experiência prática dos autores e em referências externas (Pinarelli, 2009; Comissão Europeia, 2016a; Trani, 2016):
I. Pasteurização do leite: realizada a uma temperatura de 72°C por 15 segundos, com resfriamento imediato para a temperatura de adição do coalho, normalmente 35 - 37°C;
II. Adição de ingredientes: o leite é inoculado com fermento termofílico no início do enchimento do tanque, e em seguida acrescenta-se cloreto de cálcio diluído em água potável.
III. Coagulação: ao fim do enchimento do tanque, adiciona-se coagulante (coalho) fracamente proteolítico. O leite é deixado em repouso para que ocorra a coagulação, e o ponto final da coalhada é conferido por um corte e verificação da consistência, ou pelo descolamento do coágulo das paredes do tanque de fabricação.
IV. Corte: procede-se o corte da coalhada com liras até a obtenção de grãos com tamanho de um grão de milho (~0,5 cm).
V. Mexedura: com auxílio de um utensilio de inox, tipo pá, faz-se uma primeira mexedura lenta ao longo do tanque, por aproximadamente 10 a 15 minutos, com movimentos em forma de oito, até que os grãos apresentem uma leve casca protetora. Em seguida, aumenta-se a velocidade de agitação e inicia-se o aquecimento até 42°C, com aumento de 1°C a cada 3 minutos, para que os grãos adquiram uma consistência firme e atinjam o teor de umidade desejado.
VI. Pré-prensagem: deve ser realizada por tempo suficiente para compactar a massa, aplicando-se pressão de 20 a 30 psi durante 10 minutos.
VII. Fermentação: os grãos são deixados em repouso no próprio soro durante 2 - 3 horas até que o pH atinja 5,1.
VIII. Filagem: inicialmente, realiza-se o teste de filagem, no qual um pedaço de massa é colocado em água quente (75 - 80 °C), e esticado com o auxílio das mãos ou de um objeto. Se a massa se esticar sem arrebentar, é considerada apta para a filagem. Neste ponto, pica-se a massa e procede-se a filagem com água a 90 - 95 °C. Na Itália, o processo de filagem é feito com água quente adicionada de 1,5 % (m/m) de cloreto de sódio. Dessa forma, a água salgada remanescente da filagem é empregada como líquido para imersão do queijo.
IX. Fabricação do recheio: o creme deve ser obtido por centrifugação de leite, e apresentar teor de gordura de 48 – 50 % (m/m). A pasteurização do creme deve ser feita a 75 °C por 10 minutos, sob agitação, para se garantir a homogeneidade do tratamento térmico. Em seguida, resfria-se o creme a 10 °C, e adiciona-se as tiras desfiadas de Mozzarella. Para que seja possível obter tiras finas, de aproximadamente 10 cm de comprimento e 0,2 – 0,5 cm de espessura, faz-se necessário empregar Mozzarella recém-filada, com textura ainda fibrosa, idealmente fabricada no mesmo dia da Burrata. A mistura das tiras de queijo com creme deve ser feita de forma cuidadosa para não danificar as tiras e, sobretudo, para não ocorrer inversão de fase do creme (transformação em manteiga).
X. Moldagem e resfriamento: a massa filada é moldada à mão, na forma de uma bolsa, que é recheada com a mistura de Mozzarella desfiada e creme de leite. Essa bolsa é delicadamente moldada em forma esférica, com fechamento apical preciso para não ocorrer transbordamento do creme.
XI. Salga: a Burrata é colocada em água gelada por cerca de 20 a 30 minutos para que não se deforme. Em seguida pode ser mergulhada em salmoura por tempos variáveis de acordo o tamanho e a concentração de sal das salmouras. Entretanto, esta etapa normalmente não é realizada no Brasil, pois o sal é acrescentado ao liquido ou soro em que será conservada.
XII. Envase: o envase é geralmente feito a 4 °C em recipientes plásticos rígidos contendo a solução para conservação do produto. Conforme já salientado, esse líquido pode ser a própria água de filagem. No entanto, o uso de solução salina pasteurizada, com pH ajustado por meio de ácido cítrico, permite melhor conservação.
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